Protocolos inovadores no TEV, aneurismas e insuficiência venosa ganham força no exterior, enquanto nosso país busca adaptar tecnologias e diretrizes à realidade desigual dos serviços
A Cirurgia Vascular passa por um momento de transformação acelerada, impulsionada por avanços tecnológicos e pela revisão constante das diretrizes internacionais. Nesse contexto, o cirurgião vascular e membro da Comissão de Tromboembolismo Venoso (TEV) da SBACV-SP, Dr. Adilson Ferraz Paschoa, destaca que “a medicina está em contínua evolução. O conhecimento e a tecnologia avançam numa velocidade jamais vista, e isso motiva a revisão das diretrizes. Porém, boa parte das evidências publicadas em diversos campos da ciência médica e biológica não são contundentes, o que exige cautela na adoção de novidades”.
Ao abordar sobre TEV, Dr. Adilson explica que os últimos 15 anos foram marcados pela evolução dos anticoagulantes orais de ação direta, cujos estudos pivotais demonstraram eficácia e segurança. Mesmo assim, ele lembra que ainda existem lacunas importantes, o que mantém a heparina de baixo peso molecular como “porto seguro” em cenários sem evidência sólida. Essas limitações têm estimulado novas pesquisas, especialmente em trombose associada ao câncer e em estratégias de profilaxia estendida, como no pós-Covid-19, cirurgias ginecológicas oncológicas, cirurgias plásticas, entre outras.
No tratamento dos aneurismas de Aorta Abdominal, Dr. Adilson destaca que, hoje, a principal evolução vem das endopróteses, capazes de se adaptar a anatomias cada vez mais complexas. Dispositivos que permitem cobertura das artérias viscerais e fixação proximal segura ampliaram as opções em casos com colo curto ou doente, trazendo novas perspectivas para situações desafiadoras. Apesar dos avanços, ele ressalta que são procedimentos sofisticados que exigem uma curva de aprendizado refinada.
Em relação à insuficiência venosa crônica, ele aponta a mudança de paradigma internacional. “As diretrizes destacaram como principais mudanças a indicação da flebectomia ou escleroterapia com espuma para o tratamento de veias tributárias (prática que já era comum em nosso meio), a preferência pelas técnicas de termoablação sobre a cirurgia convencional e a espuma guiada por ultrassom para o tratamento d insuficiência da veia safena externa”.
Ainda de acordo com Dr. Adilson, a preferência pela termoablação na veia safena interna já era estabelecida há mais de uma década, e salienta a evolução da terapia de compressão, que ganhou ainda mais relevância com o uso de compressões em multicamadas, bandagens inelásticas e dispositivos ajustáveis com velcro para garantir pressão de 40 mmHg no tornozelo em pacientes com úlcera venosa ativa.
Ao analisar o cenário brasileiro, o cirurgião vascular afirma que o principal obstáculo não é técnico, mas socioeconômico. Para ele, o país reúne simultaneamente a medicina mais inovadora e a mais precária, e embora haja profissionais altamente qualificados, o conhecimento e a possibilidade de implementar responsavelmente novas tecnologias esbarra no alto custo. Ele pondera que o SUS busca oferecer o melhor possível, mas que o limite imposto ao material disponibilizado, muitas vezes, não atende à necessidade técnica de cada caso.
Mesmo diante dessas limitações, ele reconhece avanços importantes no Brasil, especialmente na rapidez com que empresas nacionais têm desenvolvido endopróteses customizadas, ampliando as possibilidades terapêuticas para aneurismas complexos. No TEV, a perda das patentes dos principais anticoagulantes orais aumentou o acesso da população mais vulnerável, sem eliminar a relevância de medicamentos tradicionais. “A heparina continua sendo uma medicação utilíssima nas situações agudas e nos procedimentos invasivos, enquanto os inibidores da vitamina K ainda são muito utilizados por algumas indicações precisas, quando a substituição não é recomendada e pelo baixo custo”.
A insuficiência venosa crônica é uma condição de grande impacto econômico e social. As úlceras venosas representam alto custo para o sistema de saúde e apresentam elevada taxa de recidiva. A solução, segundo o especialista, passa por ampliar o acesso da população a centros capacitados e a tecnologias adequadas. “A espuma eco guiada, curativos dedicados e os dispositivos de compressão é a esperança que temos para melhores resultados”, afirma.
Para o Dr. Adilson, esse avanço acelerado da medicina exige atualização constante, mas também senso crítico para distinguir o que realmente transforma a prática clínica. “A medicina se aprimora e é nossa obrigação estudar e procurar a atualização. Todavia, nem tudo que se publica reverte em aplicação imediata. Além do mais, a despeito da constante evolução, ainda partilhamos muitas incertezas. Considerando a representação psicoemocional, muitas vezes relegada ao segundo plano, das enfermidades mais prevalentes de nossa especialidade, a atenção, empatia e compaixão representam muito pelo que podemos fazer pelos nossos pacientes”, conclui.





