Aneurisma da Aorta
Aneurisma é uma palavra derivada do grego que significa alargamento, sendo utilizada em medicina para designar uma dilatação permanente do diâmetro de um vaso do organismo. Considera-se como aneurisma quando a dilatação está 50% acima do tamanho normal para aquele vaso.
As artérias estão sujeitas a regime de distensão de sua parede pela pressão e batimentos cardíacos permanentes, podendo ocorrer degeneração da estrutura desta parede, cursando com obstrução ou dilatação do vaso.
A dilatação ocorre em virtude de vários fatores, dentre eles a degeneração de estruturas que compõem o vaso, como proteínas chamadas de colágeno e elastina, presentes na parede da artéria, o que faz com que o vaso perca elasticidade e resistência, desta forma aumentando seu tamanho progressivamente. A aorta é a principal artéria do organismo, já que é através dela que todos os órgãos e tecidos do corpo recebem o sangue rico em oxigênio e nutrientes. Tem origem no coração (é a via de saída do sangue pelo átrio esquerdo) e é dividida, didaticamente, em porções de acordo com a sua localização: aorta torácica ascendente, arco aórtico, aorta torácica descendente e abdominal. No tórax, dela saem ramos que irrigam a cabeça, os braços e a medula espinhal. A aorta desce então para o abdome, de onde saem outros ramos que vão permitir a chegada de sangue a todas as vísceras abdominais e pélvicas (como o estômago, o fígado, o baço, os intestinos, a bexiga, entre outros). Ainda no abdome, a aorta termina ao se dividir em 2 ramos, as artérias ilíacas, que darão origem às artérias dos membros inferiores.
O aneurisma mais comum é o de aorta e acomete, mais frequentemente, seu segmento abdominal, logo após a saída das artérias dos rins, mas pode acometer qualquer outro segmento ou vaso do corpo. Considerando-se a topografia, os aneurismas são chamados de aorta abdominal, quando envolvem apenas a aorta infrarrenal e ilíacas, e torácicos, quando envolvem exclusivamente a aorta torácica, podendo ser ascendente ou descendente. Quando envolvem a aorta abdominal suprarrenal, na porção de onde emergem os vasos viscerais, são chamados de toracoabdominais e classificados conforme sua extensão proximal e distal.
Com que frequência vemos aneurismas de aorta na população?
O aneurisma da aorta pode ser encontrado em cerca de 2% da população acima de 50 anos, 5% em homens com mais de 70 anos e 20% em irmãos de pessoas que têm diagnóstico de aneurisma.
Os principais fatores de risco são tabagismo, pressão alta e histórico familiar de aneurisma.
Menos frequentes, mas não raros, são os aneurismas periféricos (localizados nas outras artérias do corpo), destacando-se os da artéria localizada atrás do joelho (chamada artéria poplítea) e que correspondem a 70% dos aneurismas periféricos e podem se manifestar concomitantemente ao de aorta.
O que acontece numa aorta com aneurisma? Quais os sintomas de quem tem essa doença? Como é feito o diagnóstico do aneurisma?
A tendência natural dos aneurismas de aorta é o crescimento lento e progressivo, que ocorre em 80% dos casos. Os aneurismas nunca diminuem de tamanho.
A maioria dos aneurismas de aorta são assintomáticos e encontrados ocasionalmente pelo próprio paciente (algumas vezes relatada como a impressão de haver um “coração na barriga”) ou durante o exame médico de rotina, pela palpação do abdome (mais facilmente perceptível se o paciente for magro) e por exames de imagem, tais como ultrassonografia de abdome ou tomografia de tórax, realizados para check-up ou investigação de outros problemas de saúde, revelando sua existência.
Quando se suspeita da presença do aneurisma de aorta, esses exames de imagem devem ser feitos para a confirmação diagnóstica.
Como existe predisposição genética para o desenvolvimento de aneurisma de aorta, indivíduos com familiares próximos (especialmente mãe e irmãos) que tiveram aneurisma devem fazer esses exames preventivos e periódicos, a partir dos 55 anos de idade.
Ultrassonografia é o exame de escolha para o rastreamento dos aneurismas da aorta abdominal. Rápido, indolor e simples, permite medida relativamente precisa de sua extensão e diâmetro, quando no abdome. No tórax, a investigação exige tomografia computadorizada ou ressonância magnética, já que os ossos da parede torácica impedem sua avaliação por exame físico ou ultrassonografia.
Quando o aneurisma de aorta causa sintomas, uma situação de bastante gravidade pode estar presente. A dor abdominal ou nas costas é o sintoma de alerta mais importante, fortemente associado a crescimento rápido e/ou rotura do aneurisma. Trata-se de situação de emergência, que requer tratamento imediato, pois a rotura do aneurisma da aorta é associada a altíssima mortalidade. Metade desses pacientes morrem antes de chegar ao hospital e, dos que conseguem atendimento, apenas 50% sobrevive.
Além da rotura, outras complicações menos frequentes podem acontecer, como a embolização de trombos formados na periferia do aneurisma, que podem se descolar e ocluir uma artéria mais periférica, colocando em risco o território que teve a circulação comprometida. A trombose total aguda do próprio aneurisma da aorta é evento raro, mas de extrema gravidade.
Com dilatação progressiva da aorta, pode ocorrer compressão de estruturas vizinhas, provocando sintomas que variam conforme a porção mais dilatada da aorta e o órgão afetado.
No abdome, pode comprimir o duodeno (causando vômitos), a veia cava inferior (gerando inchaço das pernas, com ou sem trombose venosa associada), o ureter (causando obstrução da passagem de urina do rim até a bexiga, provocando dor e, em casos mais avançados, perda da função renal) e da vértebra da coluna, provocando dor na região acometida.
No tórax, quando acomete o arco aórtico e aorta descendente, pode ocorrer rouquidão (por compressão do nervo laringeo recorrente) e/ou dificuldade para engolir alimentos de maior consistência, por compressão do esôfago.
Outras condições relacionadas a aorta e que cursam dor torácica são agrupadas na chamada síndrome aórtica aguda. Engloba a dissecção aguda, a úlcera penetrante e o hematoma intramural de aorta. Essas alterações devem sempre ser lembradas, e investigadas com exames de imagem, nos casos de dor torácica importante, na ausência de outras causas como infarto do miocárdio, embolia pulmonar, pleurite e neurite. Passado o momento agudo, podem evoluir com dilatação, antigamente conhecida como aneurisma dissecante e, atualmente, chamada de dissecção crônica dilatada. A diferença com os aneurismas propriamente ditos é que a alteração na parede sempre inclui uma delaminação da mesma, com entrada de sangue entre as camadas de sua estrutura.
Como tratar um paciente com aneurisma de aorta?
A maioria dos aneurismas de aorta está associada à doença degenerativa, a qual tem relação com elevação da pressão arterial, dos níveis de colesterol e o hábito de fumar, este último também correlacionado à velocidade de crescimento da dilatação. Assim, esses fatores devem ser tratados e controlados.
O principal fator associado ao risco de rotura é o diâmetro do aneurisma. A aorta abdominal, no segmento abaixo da saída das artérias renais, tem um diâmetro normal em torno de 2cm. Com o avançar da idade, essa medida tende a aumentar discretamente, sendo considerada aneurismática quando ultrapassa 3cm. Quanto maior o diâmetro do aneurisma, maior o risco de rotura.
Aneurismas fusiformes com diâmetro menor que 6cm no tórax e 5,5cm no abodme (ou 5cm em mulheres) devem, além do tratamento das comorbidades acima citadas, fazer acompanhamento semestral com exames de imagem para monitorar seu diâmetro. Atingidas essas medidas ou se há crescimento do diâmetro acima de 0,5cm, em período de 6 meses, o tratamento cirúrgico passa a ser considerado e deve ser indicado sempre que as condições clínicas do paciente permitirem. Por outro lado, num paciente muito idoso ou com outras doenças graves que aumentem o risco da cirurgia, o tratamento conservador pode ser mantido mesmo em aneurismas maiores.
Além da medida do diâmetro e da taxa de crescimento do aneurisma, outros parâmetros estão associados a maior risco de rotura, tais como sexo feminino, a presença de hipertensão arterial, doença pulmonar obstrutiva crônica (enfisema) e a morfologia do aneurisma. Quando a dilatação ocorre somente em parte da circunferência da aorta, com aparência excêntrica ou sacular, sugere uma fraqueza localizada que apresenta maior risco de romper quando comparada à dilatação de aspecto fusiforme.
Quais as opções de cirurgia para tratamento do aneurisma de aorta?
O objetivo da cirurgia é evitar a rotura, despressurizando a parede na porção dilatada da aorta. Isso se obtém com a interposição de uma prótese no interior do vaso, por onde passará o fluxo sanguíneo. As técnicas disponíveis para o implante desta prótese são a cirurgia aberta e a endovascular.
Na operação aberta, abre-se o tórax, o abdome ou ambos (nos casos em que o aneurisma atinge a aorta torácica e abdominal), para um acesso direto ao segmento da aorta doente. O fluxo de sangue é interrompido com pinças cirúrgicas, colocadas acima e abaixo do aneurisma, de modo que a parte dilatada da aorta é aberta com o mínimo de perda sanguínea possível. Um tubo de tecido sintético (prótese vascular) é, então, costurado na aorta saudável, acima e abaixo do aneurisma, substituindo este segmento. Terminada a sutura, as pinças cirúrgicas são removidas e o fluxo de sangue restaurado. O sangue agora passa pelo interior do tubo, eliminando a tensão na parede arterial doente, agora excluída. Quando o aneurisma é toracoabdominal, afeta a aorta num trecho de onde saem os ramos que irrigam as vísceras e estes, evidentemente, devem ser revascularizados, o que aumenta bastante o porte e o risco da cirurgia. Nesses casos, quando se faz a interrupção do fluxo sanguíneo, esta deve ser rápida, pois as vísceras ficam sem receber oxigênio durante este intervalo de tempo.
Após a cirurgia, a maioria dos pacientes é monitorizada em UTI por 24 a 48 horas e o tempo médio de internação varia de 5 a 7 dias.
A partir da década de 1990, começou a ser desenvolvida a técnica endovascular, na qual a prótese vascular é costurada numa estrutura metálica (stent) e colocada “espremida” dentro de um tubo plástico chamado cateter. Essedispositivo é denominado “endoprótese”. Ao invés de grandes aberturas no tórax ou no abdome, pequenos cortes nas virilhas são feitos para exposição das artérias das pernas (femorais) e, através dessas, o cateter é colocado dentro do aneurisma, onde a endoprótese é liberada de dentro do cateter. Esse procedimento é todo feito com o auxílio de aparelho de raio-X contínuo, para visualização, em tempo real, da adequada localização e posicionamento final do dispositivo. Sem a abertura das cavidades abdominal e/ou torácica, esta técnica é menos invasiva, com menor agressão ao paciente, permitindo tempo de internação e recuperação mais curtos. Não pode ser utilizada em todos os casos devido às características anatômicas individuais.
A decisão em relação à técnica mais adequada deve considerar diversos fatores, relacionados à anatomia do aneurisma e os relacionados às condições de saúde do paciente.
O cirurgião vascular, por conhecer os aspectos da doença e deter treinamento tanto na técnica aberta como na endovascular, é o especialista mais capacitado para fazer a avaliação e orientar o tratamento a ser realizado, e, se for cirúrgico, eleger a técnica mais adequada, aberta ou endovascular.
Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular – Regional São Paulo – Departamentos e Comissões
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