Ferramentas devem ser compreendidas como instrumentos de apoio, sem substituir a autonomia profissional e a responsabilidade ética do médico na tomada de decisões 

A incorporação da Inteligência Artificial (IA) na medicina se configura como uma ação irreversível, conforme debatido no 3º Congresso Médico da Associação Médica Brasileira. Entre os principais benefícios destaca-se a automatização de atividades administrativas, como o registro em prontuários e a elaboração de relatórios, que podem consumir até metade do tempo destinado ao atendimento clínico. Essa redistribuição de tarefas possibilita que o médico dedique maior atenção ao paciente, fortalecendo o vínculo humano essencial ao cuidado em saúde. Todavia, ressalta-se que tais ferramentas devem ser compreendidas como instrumentos de apoio, sem substituir a autonomia profissional e a responsabilidade ética do médico na tomada de decisões.

Outro aspecto relevante diz respeito à integração da IA com dados clínicos. O emprego de sistemas capazes de sintetizar informações em prontuários eletrônicos favorece a identificação precoce de alterações em exames, a detecção de interações medicamentosas e até a sugestão de hipóteses diagnósticas. Essa aplicação potencializa a acurácia das condutas médicas, ao mesmo tempo em que reduz riscos relacionados a erros assistenciais. Sob a ótica da segurança do paciente, a tecnologia contribui para práticas mais consistentes, sem abdicar do julgamento clínico, que permanece central e intransferível na atividade médica.

Adicionalmente, o ritmo acelerado da produção científica reforça a necessidade de ferramentas digitais na atualização profissional. Enquanto no passado o conhecimento médico levava décadas para se renovar, atualmente esse intervalo é de pouco mais de dois meses, o que torna inviável o acompanhamento manual das evidências disponíveis. Nesse cenário, plataformas como o OpenEvidence permitem acesso rápido e confiável à literatura científica, ao passo que soluções como Voa Health, NotebookLM e Perplexity já se consolidam como recursos aplicáveis à rotina clínica. Esses instrumentos exemplificam como a IA pode apoiar a prática médica tanto no campo assistencial quanto no acadêmico.

Por outro lado, há ainda pontos de risco que incluem desde falhas do sistema até a eventual transferência de capacidade e risco legal desta utilização. Faz-se necessário aprimorar as responsabilidades e definir aspectos médico-legais deste uso.

Diante desse panorama, conclui-se que a Inteligência Artificial se configura como aliada na medicina contemporânea, favorecendo maior eficiência, precisão diagnóstica e agilidade na gestão das informações em saúde. Entretanto, seu uso deve ser pautado por critérios técnicos, princípios éticos e foco permanente na segurança do paciente, uma vez que o julgamento clínico não pode ser delegado a algoritmos. O futuro da prática médica aponta para uma integração progressiva entre profissionais e tecnologias, em que a IA assumirá papel de copiloto estratégico, mas jamais de condutor do processo de cuidado.

Dr. Fábio J. Bonafé Sotelo

Diretor de Defesa Profissional da SBACV-SP